quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Se cuida

Nada planejado. A pergunta. O sorriso tímido. A junção de 5 sílabas. Fora o bastante.
O carro não tinha espaço o suficiente e o barulho lá vindo de fora era pertubardor. Ele preferia o silêncio. A quietude e mansidão de algum lugar para aproveitar a única oportunidade boa que a vida lhe dera em décadas. Suas mãos nervosas não sabiam repousar depois de trocar a marcha e logo aprendeu a usar somente uma mão para guiar o carro... A mão direita segurava firmemente a dela. Unificando o tempo que ainda tinham juntos... Aumentando a veemência daquela noite que nenhum dos dois jamais esqueceria. Passearam pela cidade, até encontrar um lugar em que pudessem repousar a frustração um do outro. O silêncio entre eles nunca existira, nem mesmo em um olhar. Havia muito a ser dito, e sentido, em apenas algumas horas e se privar de tamanha benção seria errôneo demais. Não queriam pensar no depois, no amanhã. No peso que carregavam nas costas. Estavam sendo jovens, imprudentes, imaturos guiados pelo sentimento, vontade – bem longe de qualquer razão - e conseguiam sorrir e regozijarem com isto.
Suas mentes foram pra bem longe. Podia-se dizer que o alter-ego de um guiava o do outro. A troca súbita de ‘conhecimento’. Alcançavam a paz interior.

~

P -

Os toques delicados beirando pinceladas. As coxas estendidas sob o lençol branco. Os gemidos que faziam com que a mente não quisesse estar em outro lugar a não ser ali. Guardando aquelas expressões no lugar mais seguro que tinha em seu âmago.

E -

O corpo sobre o seu. Esforçando-se para provocar algo mais intenso a cada segundo, a cada investida. As mãos tocando seu rosto, os lábios sugando o seu suor. Os olhos penetrando a sua alma. Como nunca ninguém fizera antes. Como ninguém nunca se importara em fazer...

Não tinham a mínima idéia de quanto tempo ficaram imersos em carícias e sorrisos bobos. Duas bestas sentimentais. Vivendo pela primeira vez, juntos, algo inusitado. Inesperado demais. Tão completamente novo que fazia-se tornar seguro. Mesmo que o mundo os chamasse de volta com pequenos alertas – imperceptíveis.

Foi ele que voltou a si. Lembrando do quanto era antiquado, do que esperavam que ele fizesse depois. -De como devia agir. As palavras que devia usar. A rotina que deveria seguir. Apenas aquele momento, pra ser completamente o que queria. Com ela.

Fotografou o rosto redondo e macio pela última vez. Contemplou aquele par de petecas marrons e voltou à realidade. Sem se permitir sofrer.

As mãos continuaram juntas até o destino. Ela sentia o cansaço tomar conta do seu corpo. Mas sabia que tudo aquilo seria multiplicado, na manhã seguinte, em sua cabeça. Beijava-lhe as mãos. Queria manter o cheiro dele em sua pele. Eternizar tudo em lembranças. Guardou em seus ouvidos cada música que parecia expressar completamente o que acabara de acontecer. Mais tarde iria chorar por não ter dito o que devia.

O Adeus foi breve. Quase a despedida de dois saudosos amigos.

‘’Se cuida’’ - Disseram um ao outro. O último beijo. A última união dos lábios chorosos de vontade.

O início do fim. O que poderia ter sido e não seria. Jamais. O tempo passado antes de chegar. As vidas seguidas como se nada tivesse acontecido… Um devaneio passageiro.

A vida normal os esperava lá fora.

‘’Too young to hold on and too old to just break free and run…’’


Texto é da Fany Dimytria do blog Cold Water. Eu (Helder) não via a Confraria sem um texto dela, no caso feito especialmente para nosso blog. Espero que ela não demore para enviar o próximo.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Insulto I


"Uma peregrinação involuntária talvez fosse a solução.
Auto-exílio nada mais é do que ter seu coração na solidão"
Conexão Amazônica - Legião Urbana

É discurso fora de moda, vai à contramão da humanidade, do progresso, da liberdade sexual, da vida artística de malhação e novelas das oito. Mas o fato é: o mundo inteiro está infeliz com tanta liberdade.

E boa parte da culpa deve-se as opiniões turvas, e cheias de ênfase, dos auto nomeados intelectuais modernos, que não passam de primatas que usam a linguagem de forma oportunista.

Leia duas ou três vezes a opinião de um antropólogo de araque, aqueles de determinam o lote e o prazo de validade do amor, e perceberá que seus argumentos não suspendem uma pena ao vento. Os cientistas e seus vícios de classificar tudo e todos, reduzem um complexo jogo de sentimentos a algumas ligações de sinapses nas regiões do cérebro afetado no ventre.

O fato é que em situações vexatórias, onde não são analisadas as telas de raios-X do cérebro, até o mais racional dos seres recorre à poesia, ao abstrato, e tudo aquilo que não podemos reduzir a uma função matemática.

A música, a pintura, a literatura e até as imagens do Google, expressam melhor um sentimento do que a opinião de um especialista (os de araque). Uma piada de bar talvez cause tanta reflexão, quanto uma análise da conjuntura sócio-afetiva de um sujeito abandonado.

O discurso fora de moda não descarta o valor do livre pensamento, e da ciência, mas afirma que os valores têm importância maior do que um livro de Engels, que colocar-se no lugar de outrem vale mais que uma leitura de horóscopo, e que respeito não se aprende na faculdade.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Convivência*

Foi na feira de livros infantis que a viu pela primeira vez. Dali a cinco anos estariam casados, com dois filhos e insuportavelmente dividindo a mesma casa. Se soubesse disso, não dos filhos, jamais teria parado para perguntar se ela já tinha lido O Pequeno Príncipe. Foi amor a primeira vista, garantiram. Mas a convivência é mesmo uma merda. E ela passou a se incomodar com as cuecas jogadas fora do cesto de roupa suja. E ele passou a se incomodar com a tampa do vaso sanitário sempre fechada. Era pasta de dente apertada em qualquer lugar e louça suja por um dia inteiro em cima da pia. Se soubesse de tudo isso, que chegariam a esse ponto, jamais teria contado a história d’O Pequeno Príncipe, quando ela respondera que nunca o tinha lido. Casaram na igreja mais bonita da cidade, e mais antiga também. Tinham amor para a vida inteira, como diziam. Tinham cativado um a outro e eram ambos responsáveis por isso. Mas a convivência, lá vem ela, os tornara tão desconhecidos quanto antes de trocarem as primeiras palavras naquela feira de livros infantis. Ela, sabedora de tantas coisas, resolveu deixar a vida levar para o caminho que desejasse. Ele, que sempre fazia tudo o que ela queria, concordou e seguiu assim. Mas as revistas de moda espalhadas por toda a sala, e a televisão sempre ligada no SporTV começaram a não só torná-los insuportáveis um com o outro, mas com todos os outros. Não recebiam mais visitas e sequer dormiam no mesmo quarto. Mandaram os filhos passarem férias com os avós. O pai dele e a mãe dela. Cada um com um para, pelo menos aí, não se desagradarem. Ele resolveu sair de casa, não ia criar caso por causa de um sofá velho presenteado no casamento. Ela, naquele dia, resolveu ir dormir na casa da melhor amiga. A casa ficou vazia. Sem desentendimentos, sem crianças, sem pais, sem amor. Ele decidiu que realmente ainda não estava preparado para iniciar um novo relacionamento. Olhou bem para aquela moça na feira de livros infantis, mas depois de vivenciar mentalmente como estariam dali a cinco anos, devolveu O Pequeno Príncipe para a prateleira.

*Texto de Jeronymo Artur. Há tempos ele já escreve. E muito bem.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Dimytria II


 Dimytria sentia sua garganta dolorida. Mas não era dos gritos que conseguia externar e sim daqueles internos que outrora prendera para não machucá-lo. Talvez a culpa dessa situação fosse sua pois, quando deveria falar, calou-se. Havia uma possibilidade do que poderia ter dito, tivesse mudado algo.

 Engolia a seco. Prendia suas lágrimas distanciando pensamentos sobre ele. Concentrava-se na sua respiração para não desabar prematuramente. Sabia que a partir de hoje sua vida seria diferente com ou sem ele.

 E quem vai entender o amor? Pode ser que nem exista. Pensava. Agora deitada em seu sofá, sua cabeça cuidadosamente encaixada na almofada. Lágrimas desciam lentamente de seus olhos. Era impossível evitá-las - percebeu.

 Adormeceu ...sem respostas

Filosofia barata das ambiguidades amorosas

Pensemos por um momento nas ambiguidades e o quanto podemos suportá-la, mas antes de entrar nessa questão especificamente, vamos ver seus desdobramentos em nossas vidas. No que toca a nossa sociedade, as ambiguidades são evidentes, estão por toda parte e não só nas relações e nos fenômenos como em nós enquanto pessoas, elas nos atravessam o tempo todo. Ocorre, a despeito disso, que muitos pretendem suprimi-la, e quando percebem que isso não é possível por completo, tenta-se pelo menos disfarçá-la, criando ilusões de que ambigüidades são dissimuláveis. O amor, por exemplo, é uma boa expressão disso, ele é ambivalente, pois não é uma unidade total, completamente coesa, com sentimentos sempre alinhados e afinados, mas um continuum ambíguo, e afinal essa é a própria dinâmica da vida.

Se você, leitor, assim como eu, vê algum sentido nisso aceitando tal argumento como uma verdade ou pelo menos como uma quase verdade vai se deparar com o seguinte fato: se nós recusamos a ambiguidade em nossas vidas e sendo o amor uma de suas expressões, significa que há uma tendência nossa de fugir dele e recusá-lo também. É importante explicar que o fugir do amor não é necessariamente recusá-lo em seu modo radical, recusar aqui significa uma gama muita variada de modalidades possíveis, por exemplo, podemos dizer que fugir do amor é complicá-lo, colocar condições tolas, adiar sua concretização, enfim quero utilizar o termo ‘recusar’ como todas as estratégias diversas para tentar suprimir e/ou disfarçar essa tal ‘ambiguidade’.

E é exatamente nesse ponto que reside o ponto mais interessante sobre nossa reflexão, pois quanto mais recusamos a ambiguidade, mais ela existe em nós, e por conseqüência quanto mais recusamos o amor mais ele existe em nós. Nesse sentido, o que proponho aqui é que quanto mais inventamos sua recusa sob diversos pretextos mais ele nos afeta e nos atravessa e, portanto, é mais presente; por outro lado, quanto mais se procura pelo amor mais o banalizamos e o esvaziamos - é um movimento dialético no sentido grego, sem síntese. É um mecanismo que funciona inversamente proporcional, ou seja, quanto mais se extingui algo mais se cria, quanto mais se suprimi mais se multiplica; podemos dizer, por essa razão que a invenção sempre contrainveta alguma coisa. Isso, por exemplo, corrobora a máxima popular de quanto menos se espera o amor mais próximo ele está de acontecer, justamente porque você não está a inventá-lo artificialmente ou forçosamente, e o inverso é verdadeiro, quanto mais se procura menos se encontra.

Para concluir, as ambiguidades são fatos, e temos talvez três opções diante delas: uma, recusar por inteiro, outra aceitar completamente, e uma terceira, que me parece a mais inteligente, equilibrar, aceitar em partes a ambiguidade e recusar em partes também, encontrando uma espécie de meio termo, que por natureza não é perfeito, mas satisfaz, traz conforto. Nesse sentido digo, sejamos medianos, pois este pode ser um modo de se equilibrar na inevitável incompletude das coisas e uma maneira de lidar com a ambigüidade sempre presente em tudo e todos.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Carta à tímida


Querida,

Fizeste muita, mas tanta questão, pura birra, em deixar minha persiana fechada, luzes apagadas, e de nada serviu. Existem as indiscretas brechas da janela. Pra que festas à fantasia, se existem as frestas da fantasia? Sim, minha compañera. Elas são pequenas revelações, ou melhor, pequenas acusações do desenho da tua silhueta de fino-trato e personalidade fuerte.

Uma luz raquítica e cinzenta, mas que é das minhas. Não me deixa sem a imagem dessas curvas discretas, mas que se vacilar, acabo derrapando fácil.

Diz a ciência que o polegar opositor fez da nuestra espécie a mais evoluída entre os animais. Pra este darwinista de araque, o formato de pinça da minha mão só ganha dignidade quando encontra tua cintura estreita, mas com presença.

É da tua índole me incriminar de só pensar com a cabeça debaixo. Blasfêmia! Gaiata, penso em você com todas as cabeças, inclusive com a dos dedos – estes que perdem a prudência na cobiça de tocar essa macia carne pálida.

Sempre que recordo daquela cena, acendo meu cigarro imaginário, pois todo orgasmo exige um, mesmo dos que não fumam. Usted não imaginas o quanto é difícil se concentrar na pauta exigida pelo editor, quando minha concentração está na cena: tua nudez na minha cama de solteiro – donde você fez questão de ocupar os latifúndios produtivos e improdutivos com sua singular folga charmosa.

Esta carta é só pra deixar clara a perturbação que provocaste. Nada mais. Nem te cobro uma resposta. Sei da tua satisfação em me deixar nesse estado. Ainda me recordo de enxergar no breu o furinho da tua bochecha, culpa de um sorriso doloso, entretanto, sem perversão.

Afirmo que não me tapeia mais com timidez. Você é calculista. Apenas precisava esclarecer. Mas te quero.

Desassossegadamente,

H. C. Jr.

PS: Envio em anexo tuas fotos que fiz. Tenho molduras para elas.





*Apenas para evitar qualquer confusão ou algo do tipo, lembro que é uma ficção, povão. Tanto texto quanto fotos. Nada mais, cierto?

Sujei-o de batom

Foi a mim confiado como peça valiosa. Mas eu, sujei-o de batom. Nervosa, desajeitada, sem saber onde colocar as mãos, eu simplesmente sujei-o de batom. Deixei a marca mais indesejável, suspeita, errônea que uma mulher pode deixar no que não é seu. Ou – no que é seu por um instante clandestino. Era essa a forma que eu tinha de agradecer a confiança a mim reservada? Esse era o tratamento desleixado que eu oferecia a algo completamente entregue em minhas mãos? E agora, que explicação teria? Quais desculpas se carregam em páginas seguintes para um descuido tão inútil e revelador? O que responderia ao olhar decepcionado, naquela noite, sob a luz da luminária na cabeceira da cama? Reparar, assim, naquelas entrelinhas, uma marca inexplicável e irreparável...

Naquela sala de espera, no ante-momento que decidiria os próximos caminhos da minha vida que é alheia e pessoal, sujei de batom aquele livro que me destes para ler enquanto o esperava. Como isso veio a acontecer? Pergunta grotesca, desconcertante. Peguei o livro e me entreguei à dança de segurá-lo com uma mão e folhear com a outra que, entre página e outra, também apoiava o queixo e tocava os lábios. Para confessar, na minha inquietude, a cada folha virada, a cada verso olhado e não lido, entre aqueles minutos eternos que você finalizava o seu trabalho, eu também roia os cantos dos dedos (as unhas, jamais) e foi assim que deixei a minha digital rosa na ponta superior daquele papel branco, sobre aqueles contos de teatro marginal.

Em desespero, fiquei. Como poderia aquela marca aparecer ali? Simples e inocente? Era a prova do meu desjeito. Minha reprovação. Minha censura. Tentei apagar com saliva (como a gente faz no colégio, quando borra o lápis e não tem borracha). Piorou. Sujou ainda mais. Era inútil qualquer tentativa de recompor a página branca, lisa, limpa. Marca de batom é marca para a vida toda. Esperei, conforme esperei minha condenação. Até que, na hora do juízo final, passou o livro ao meu pertencimento, com toda a minha culpa: “O livro é seu. Leve-o para você”. Deu-me de presente como a minha inocência vadia. Agora, eu posso sujá-lo verdadeiramente. É meu, mesmo impuro.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Dimytria I


Pegou seu celular e começou a ler as mensagens. Parou em uma:

"Te Amo A Lot Of"

Será que era isso mesmo? Porque nada se encaixava no modo como Pedro se comportava agora. Já não era mais aquele cara que roubou o primeiro beijo e que a tomava pelos braços.

A única certeza que tinha era que o amava ainda mais... mesmo depois de dois anos e de tantas mudanças ocorridas. Desconfiava da sinceridade de todos os " TE AMO" ditos por ele

...

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Posologia do porre a dois.


Extra, extra! Direto do calor dos Los Angeles, o casal inglês libera a pílula da sabedoria conjugal:

“Se as crianças já estão na cama, trocamos de roupa e vamos a um restaurante. Comemos um pouco, tomamos um porre e curtimos a companhia um do outro. Sempre fico ansiosa para sair à noite”, arrebata a eterna ex-Spice Girl, Victoria Beckham.

A afirmação, retirada desta matéria aqui, mostra uma sapiência fora do comum.

O boleiro David Beckham, que em outras épocas era tido como afeminado, praticante de atividades suspeitas tais quais usar a calcinha de su compañera durante os jogos, se mostra o guru da relação estável.

Caro Beckham, agradecemos por divulgar os benefícios de uma embriaguez com a amada. Valorize o porre a dois. É o grau máximo da intimidade, além do próprio coito em si. Vodcas, cervejas, tequilas, caipirinhas, cubas libres, enfim, independente da modalidade da ‘mardita’, elas fazem a primordial tarefa de unir ainda mais o casal.

Sem preconceito com adeptos de determinadas religiões anti-álcool, mas a verdade da bebida e suas conseqüências para o aconchego precisam ser propagadas.

Minha querida amiga Branca me confidenciou o quanto é feliz. A razão para tamanha alegria vem da afinidade etílica com seu esposo. O herói compra a birita, faz o tira-gosto e ainda serve de reboque quando o juízo se foi. É o marido perfeito, segundo ela.

Não falo nem dos casos de paixões arrebatadores que nasceram durante uma bebedice.

Romantismo é o macho carregar sua ébria querida para a cama. Ou a dama que desabotoa a camisa, retira sapatos e meias, desata o cinto e puxa a calça do seu embebedado do coração. Não importa quem caiu primeiro.

Aproveito o ensejo e faço aqui uma sugestión para a famosa pergunta matrimonial. Isso mesmo, estou me referindo àquela que consta o trecho “na saúde ou na doença”. Peço que seja adicionado “na sobriedade ou na bebedeira”, para aí sim mandar um “até que a morte, por cirrose ou não, nos separe”.

Outro “detalhe tão pequeno entre nós dois” que nem o Rei Roberto foi capaz de descrever é a ressaca solidária entre amantes. Nada como dois pombinhos terem a chance de dividir a culpa por uma amnésia alcoólica. No outro dia, pela manhã, não terás remorso pelas peripécias da noite anterior. Enfrentar a secura na boca, tremedeira e dor de cabeça segurando uma mão amiga é bem mais fácil.

Compartilhar os dramas financiados pelos pileques fortalece os laços afetivos. Só quem ama é capaz de segurar a cabeça enquanto a/o cônjuge provoca vergonhas e refeições passadas perante o vaso sanitário.

Lutemos por mais momentos dessa camaradagem. Briguemos pela dependência recíproca, onde um dá força pro outro na hora de encarar a realidade de ir comprar o dorflex e o engov na farmácia. “Amor, aproveita e traz um copo d’água.”, suplica a enamorada. Anos de terapia de casal não provocam tamanho efeito positivo.

¡Pelejemos pela ebriedade amorosa!

domingo, 10 de outubro de 2010

De onde vem esse vazio?

Dizem que a distância acaba com qualquer coisa. Mas se acaba, meu bem, é para reiniciar. É que a distância também é capaz de aproximar. E se distância distancia é porque, na realidade, nunca se esteve próximo. A distância pode dificultar mas, no fundo, ela facilita. Porque você só é o que você é, quando você está só. Talvez eu diga isso porque esteja um pouco triste por mais uma noite de domingo solitária. Sem pipoca, filme, missa, sexo e sushi. Talvez, porque esteja descrente do amor e ache tudo uma grande farsa e mentira. E seja obrigada a sustentar esse vazio não sei de quê, nem de onde vem. Mas consigo visualizar melhor a diferença entre estar namorando e ter um namorado. E, mais, a diferença entre estar acompanhado e ter um amigo. E quando me vejo solteira, sozinha e sem ninguém, escutando as mesmas músicas, lendo os mesmos blogs e tendo os mesmos pensamentos escrotos sobre “que merda que é essa vida” ou “fodam-se os homens”... Eu não sei o que pode ser pior. Dizem que tudo é questão de tempo e de costume. É claro, ninguém vai dizer: “sua puta, sua idiota, sua imbecil. Como você pôde fazer isso? Deixar alguém que tanto ama e que te ama? Você merece queimar no fogo do inferno!”. Porque de um lado, existem os diabinhos defensores da solteirice. E, de outro, os anjinhos, os cupidos defensores do amor. E no meio há você. Você imerso nas suas dúvidas, nos seus sonhos, nos seus desejos, nas suas saudades que só você sabe e só você entende e, se você não entende, ótimo! Afinal, você também tem esse direito. Além disso, mais cedo ou mais tarde a gente decepciona ou é decepcionado. Depois disso o processo de “esquecer e superar” facilita e acelera um pouco. Nunca vi ninguém entrar na fossa por ódio. A gente entra na fossa por não receber uma ligação “só pra dizer eu te amo” ou por não ter ninguém pra ligar “só para dizer eu te amo”. Por não ter alguém para abraçar e chorar um pouquinho quando qualquer dor inexplicável bater. Por não ter alguém que te entenda naquela idéia maluca para salvar o mundo ou naquela opinião esquisita sobre o último filme que viu. Ou, simplesmente, por não ter alguém para dividir você; ser alguma coisa junto e participar... No fundo, eu ainda prefiro achar que amor, amor mesmo, não é isso. E por isso, fico aqui sem saber direito de onde vem esse vazio...

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Amanhecer



Sabe quando a gente perde a direção

Quando os amores já não são mais tão amáveis

E o que passou, desceu rasgando sem piedade

E você pensa, você jura

Nunca mais fazer o mesmo, nunca mais acreditar

E cada novo amor parece espelho do passado

Refletindo cada erro, repetindo cada cena

Sem pausar

E você quer seguir em frente

Reescrever a tua história

Outra vez, ainda mais

Mas te parece que os reflexos to passado

Viram fantasmas sempre prontos

Predispostos a tirar a sua paz

E cada um tem um palpite, uma receita milagrosa

Que te tire desse quarto escuro,

E te liberte dessa dor

Mas, de tudo que já ouvi

Nada mais duro e verdadeiro

Do que o que alguém

Essa semana me falou:

‘Ergue a cabeça, olha pra frente

Que o passado...

Esse... já passou.’

Tanta coisa aconteceu enquanto eu dormia

Mas agora abro a janela

E posso ver com clareza

Que já é dia.


Thaís Carvalho

Hai kai da humildade da fêmea

Abaixe o tom de voz, mulher
Acorda, deixe de foba
Pois não te quiero cheia de querer ser

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Dicionário da Mulher – Verbete: A dança

Nemo saltat sobrius
"Ninguém dança sóbrio."
Provérbio latino


Entre as coisas das quais crio mais coragem em me aventurar após empurrões etílicos goela abaixo são escrever e dançar. E faço questão de me atrever no aprendizado de cada uma delas. Litros de certeza na cabeça e concentração nas mãos, pois é preciso precisão, como diz o outro, ao empunhar a caneta ou a cintura da dama cortejada.

De acordo com os ensinamentos de uma amiga, dessas que se tem mais do que amizade, a dança é, nada mais nada menos, do que 70% na hora de tentar o primeiro contato imediato com a intenção de chegar ao terceiro grau. Completando os dados do instituto de pesquisa Data/Romance, ela não me disse, mas arrisco afirmar que os demais 30% ficam a cargo do layout do sujeito, do papo dez e da confiança do abnegado.

É claro que a margem de erro se estica mais que borracha de estilingue, depende da ocasião. Sem verdades absolutas no cabo de guerra do amor. Mas não é por acaso que a minha querida diaba utiliza de métodos similares ao dos pesquisadores para provar que a dança é o atalho mais delicioso para alcançar o ouvido da madame.

Ah nós homens, somos tolos, cheios de embaraço em abrir mão da dureza segura de nossos quadris. Anos de educação negativa nos indicam que isso que coisa para os mais afrescalhados. Mentira. A mulher deseja de seu parceiro não só o acompanhamento, mas a condução dos passos. E para tanto, só sendo um “sem-vergonhi”. Elas gostam de “sem-vergonhis”.

Aos leitores-cinéfilos, não cabe a desculpa de falta de exemplos que provam a eficácia da dança. Vide o personagem do sempre genial Al Pacino, no fantástico “Perfume de Mulher”. Cego excêntrico, mas enxergava há quilômetros o valor do “dois pra lá, dois pra cá” bem executado. Vão de tango, a dança que mistura drama, romance e suspense de uma lapada. Nota-se que a moça, bem mais jovem diga-se, fica sem fôlego perante tamanha segurança. Risos e suspiros tímidos da pequena são os aplausos para o nosso herói.

Com algum tempo de jornada, confirmo que a dança de salão é um dos melhores pretextos para se falar as mentiras sinceras e verdades fantasiosas. É bom que só para flertar.

Não venho aqui enganá-los. Reconheço que ainda não fico nem perto de merecer o título de “Grão-mestre-pé-de-valsa”. Mas sou enjoado. Na minha teima, começo a apresentar sinais de evolução. Homo erectus dá espaço para o homem de swingtherndal. Entre uns passos em falso e pisões nos calçados femininos, vou assimilando a arte do entrançamento musical de corpos.

É sempre um prazer para o homem empunhar com a esquerda a mão delicada, na direita o quadril convidativo e no nariz o perfume de um cangote. O sacrifício de unhas pintadas com esmalte à serviço da dança é a materialização da compaixão superior de uma mulher, digno das deusas.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Mapa Astral


Uso este blog para que todos conheçam o que considero, o maior inimigo do amor: o horóscopo. Esse dossiê fabricado tem promovido inúmeras inverdades sobre determinados “blocos” de pessoas, e ninguém fala nada.
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Que os astros me perdoem, mas quem eles pensam que são para afirmar: “Sagitário não combina com peixes, câncer não combina com quase nada, e não adianta insistir”? Balela! Que coragem afirmar que as combinações amorosas se limitam a ascendência de um mapa astral! Prefiro acreditar na procedência.
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Câncer é emotivo? Errado. Seres humanos são emotivos, uns escancaram, outros engolem o choro. Relacionamentos com Áries é tenso, profundo, rico e desafiante? Pois bem, que relação não é? Será que existe o signo coringa, e ninguém soube ainda?
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De qualquer modo, é bom que exista o horóscopo de revista, o espaço preenchido no jornal local, e que continuem com os conselhos vazios do tipo: “O tempo da decisão chegou”, pode ser que você não tenha nada a decidir, mas é sempre uma leitura divertida.
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Mas por favor, caros leitores, não acreditem em horóscopo! Imagine o fim de um relacionamento, dois amantes chorosos, tristes pelos cantos, reclamando: “por que não nasci noutro mês? Teria dado certo...”. Os ascendentes que se preparem, vai sobrar pra eles.