Porque a gente se apaixona pela vida, pela pessoa... e pela
cidade também
É no
Viaduto do Santa Tereza que meus joelhos tremem. Aqui embaixo vão os mendigos,
enquanto que os poetas passam lá em cima - embora haja casos de completa
indistinção entre seres e caminhos. Me contaram, afinal, que era por onde
Drummond e tantos outros caminhavam madrugada adentro, imersos em boemia e
solidão. Lembro disso e apresso o passo como em poesia. É preciso estar atento ao
que pode te tomar de assalto. Certa vez, alguém disse: “ela passa por aqui
todos os dias”. Tremi. Morri. E suspeitei ser tempo de mudar o trajeto e,
assim, a história quase inteira. Em cada esquina, há policiais distraídos e
eles me parecem um tanto quanto vulgares.
Viaduto Santa Tereza – construído em 1929 – os mais inspirados e aventureiros escalam os arcos
Avistei um garoto que, como eu, levava cor nos cabelos e duvidava da vida: não sabia o que era falso, verso ou devaneio. “O que há de tão poético nessas Minas?” - Eu não cansava de me perguntar. Foi já na Estação Central do metrô que uma Sra. Gari, meio translúcida de cansaço, meio feliz de cachaça, avistou o trem (o trem de verdade), de longe, e disse: “Lá vem o bichão! Pode correr gente! Olha isso, de tão feio, é bonito!”.
Me
despertou um sorriso convincente: essas são as Gerais, onde se é apaixonado
pela simplicidade e leveza da vida, e a coincidência é um encontro com o
cotidiano que facilmente vira verso. Eis o segredo da crônica. Mais de 20
milhões de pessoas por entre as mais de 800 cidades, seus queijos, cachaças,
doces de goiaba, miniaturas em pedra-sabão, tantos nomes de santo e um
histórico inteiro de romances indecifráveis.
Gameleira: onde Rio Branco nasceu; e meu destino é acordar
Por estas Minas Gerais se vai em silêncio tranquilo, por algo que preenche o peito; se volta por algo que sufoca e não cabe mais. BH, afinal, é dona da grandeza que atrai e amedronta sua vizinhança. Em alguns casos, gera conflito e inveja, só por conta de sua completude e autonomia - como num amor não correspondido. E só quando brinquei de poeta e rabisquei estas linhas, que me dei conta que meu destino diário é a Estação Gameleira, aquela de mesmo nome da árvore da curva do rio, d’onde Rio Branco nasceu, lá no Acre. Viu só?
Encontro
e saúdo Paulo Mendes Campos, aquele cronista que diz que “o amor acaba”,
e sou obrigada a concordar, porque ele também sabe que o amor recomeça, em
qualquer esquina, diante de qualquer sorvete, espetáculo de dança, canção do
Milton Nascimento ou ipê amarelo da Praça da Liberdade.
Praça da Liberdade: onde é justa toda forma de amor, bem como guerra de travesseiros, espetáculos de beijos, lágrimas civis e um jardim que perfuma longe
Mas o que eu queria, o que eu queria mesmo, era compreender estes olhares, ser poeta e ordenar algumas frases que expressassem bem o fato de que, naquele dia, embora houvesse sol, caqui e tempo, faltava alguém que deixasse as mãos firmes, ajudasse a ocupar o banco vazio e ouvisse o chamado (acreano) que diz: “cuida...”. E me dou conta da sensação de que tudo só pode ser somente quase perfeito.
Ítalo
Calvino não é mineiro, mas talvez pudesse ser; foi ele quem ensinou, pois, que
“de uma cidade, não aproveitamos suas sete ou setenta e sete maravilhas, mas a
resposta que dá às nossas perguntas”. A cidade, penso eu, é o que cada um é
como indivíduo, e se torna o que você está disposto a ser ou a questionar. Belo
Horizonte foi uma ilha. Agora é constelação que compõe um Cruzeiro do Sul e me sinaliza:
“avante!”.
ps: fotos encontradas pela internet, sem autoria informada
<3 já pode mudar?
ResponderExcluirMassa demais. Adoro ver e comer de pensamentos tão belorizontinos e tão frescos de sentimentos cotidianos, de pele, de amor, de olhar sensível. Obrigada por partilhar. beijo moça
ResponderExcluirSempre! =)
ResponderExcluir